quarta-feira, 15 de fevereiro de 2012


O Instante do transe*

Vultos, surtos & o ardil extático dos corpos em convulsão. Transe bacante silvando para além dos contornos... em um coletivo confuso que cantava a maré alta do delírio. Coribantes serpenteando até roçar o infinito. Era um ritual xamânico com seu urro que soletra precipícios na soleira do crepúsculo?
Ví crianças, jovens e velhos fundidos na idade da intensidade. Até os suntuosos pilares do edifício se lançaram ao chão para rodopiar nos movimentos dos astros que ali se eclipsaram.
Ora se ouvia o silêncio e o dilatar de dilúvios que vinham pousar em nossos ombros. Ora o alarido alado da nau de loucos urrava no ritmo virulento do êxtase.
E o feiticeiro sarcástico incendiava seu tambor com as garras felinas de quem rasga a realidade. Naquele mesmo salto em que brechas se abrem e jorram desvarios.
Ao fim do ritual recolho meus pedaços esparsos e, desesperado, tento recompor alguns passos que caibam no chão.

* texto livre sobre a experiência da Jam da Companhia J. Garcia Dança Contemporânea.


domingo, 12 de fevereiro de 2012


fusão a frio
              do teto que comprime meus pés

veias velejam nos arrabaldes

arrancar glossolalias aos tapas?

seringas dançam incertas & seus pulsos pululam sarcásticos

cáusticos telefones usurpam o caixa

E você me olha, como esperando que virasse a mesa

E você sempre alheia às visões descalças que penteia 




sexta-feira, 10 de fevereiro de 2012


Bastaria dizer: mar
ou
a algazarra de espelhos que espumam a Lua
ou
a fúria de Netuno que a tudo dissolve 
para o elemento profundo  
                                          & indefinido

Cintilante fluxo do obscuro

os olhos que transpassam o verso são comparsas
de seus delitos
                            delírios
                                           defeitos

desfeitos, os lábios balbuciam o caos.

quinta-feira, 9 de fevereiro de 2012


Di bacadêla

O unicónio entou no bulaco da cama 
                      & sumiu
                                    no sonho

a lua quecente não tem mãe...

meu colá de coba binca na mocota

atás da loja tinha um monsto... fote... bavo.. qué me pegá.

a buxinha tá pidida no mato

popó machuca meu sonho

Cê viu o pum do céu?

Tem um au-au dançando na lua

Vô cota a falpa do meu ião

fapo bavo qué pilulito

Vamo bincá, di bidade?

(Joana VidaBoa, 02 anos)

Nota de acesso (ou prefácio interessantíssimo e inútil).
Minha filha, Joana, tem um hábito bastante poético: logo que acorda vai narrando coisas aleatoriamente, em ritmo compulsório. O pai bobo logo fica estarrecido com a desenvoltura de sua poetiza, e, uma vez, anotou rapidamente as falas dessa “narrativa automática” delirante. No mais, é interessante notar o ritmo da fala infantil, bastante poética, que reduz o idioma a uma série de rimas abundantes: mamá, côco, bincá,au-au, etc. Taí o estado de sonho desperto – ou talvez a infância como um sonho perpétuo.

segunda-feira, 6 de fevereiro de 2012


              pequeno delito do deus zombeteiro:

        berimbau de Naná zumbi na encruzilhada

    zanza meu corpo no ritmo do transe

zoa a quilômetros de intensidade

quinta-feira, 2 de fevereiro de 2012

pras picas
a épica ou a lírica

à merda todas
                assonâncias
                     aliterações
                            anáforas
    & seus anacronismos

O ritmo poético é outra forma de respirar, porra!
(parece que nunca gozou!)

quarta-feira, 1 de fevereiro de 2012

Quando o transe goteja
                                 

                                suas certezas para o ralo
 

Quantos vê de si a bailar no umbral do abismo?