PoemaCine
Sempre me intrigaram as relações
entre poesia & cinema. Revendo a experiência do “poemecine” de Man Ray tive
alguns lampejos.
Em L’Étoile de Mer (1928), Ray
dá livre curso às imagens oníricas do poema homônimo de Robert Desnos - que
inclusive figura no filme como ator. Os versos filmados ganham uma visualidade
muito diferente das letras estáticas impressas no papel. Sente-se a influência
do roteiro para peça teatral La Place de
l’etoile, de Desnos. O encontro insólito de personagens em devaneio
inconsciente coaduna com o encontro entre poesia, teatro e cinema. Chama
atenção o efeito de lente que Ray utiliza para assemelhar as imagens a pinturas
em movimento.
É um poema-cinema não só por
utilizar um poema como disparador. É poético pela irrupção de imagens ao acaso,
despidas de qualquer foco narrativo convencional. É linguagem do inconsciente
que transborda num fluxo incontido de associações inusitadas. O fato de grande
parte do cinema atual se ater à narrativa linear e ao vaivém de tramas e
personagens, o coloca muito próximo da linguagem da prosa.
E Ray não para por aí. São
frequentes as esculturas em dança, deixando antever perspectivas inesperadas –
especialmente no jogo de sombras que costuma utilizar. Outras vezes são sombras
distorcidas e a dança veloz de objetos que dão efeitos vertiginosos – aqueles
mesmos que Stan Brakhage iria trabalhar mais tarde, já com a efusão de cores,
muito influenciado pelo amigo e poeta Michael McClure.
O que parecia impulsionar o
experimentalismo do cinema de Ray é o escorrer de imagens em movimento, que
permitiam relações inusitadas entre poesia, teatro, fotografia, pintura,
escultura e dança. Se coloca todas linguagens em movimento também as retira dos
redutos fechados da fragmentação das expressões artísticas em especialidades. O
que importa é mesmo o potencial das imagens que desconhece os limites da expressão,
conduzindo a uma combinação incandescente que revela novas possibilidades de criação.
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